quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009

Narimbá

Narimbá quebrado no barco sai para o mar
a pele morena sabe a destinos de Sol e sal
e Narimbá parte, os dias todos pela manhã.

Leva farnel, uma sardinha o pão de maná
olha as ondas em héxagono sisal
espera o tempo largo medindo o céu
descaindo de luz nas pratas do seu mar.

Houve um dia o barco no areal.

Nesse dia o Sol subiu mais alto
soltou gotas escondeu o olhar
de nuvens cinzas ondas sentidas.

Foi o dia mais triste na praia de Iemanjá:
14 de Fevereiro - o dia da sereia

Narimbá entrou no mar.

Convictos

Das manhãs laminares
que deslizam pelo útero
escolho aquela
vermelha suspensa
em os olhos se espalharam
grandes e convictos
e nunca mais te viram.

As paredes do meu ser

AS paredes dos meus dias são feitas de vidro
sujeitas aos sinais do clima;
sol intenso, águas de chuva, gotas de grizo
intenso frio:
três camisolas, um anorak, meias de lã
mas sobrevive o brilho
de um sorriso hortelã no ar adverso
e as formigas seguem o seu caminho
tão escuro, tão espesso, nas rotinas
da cidade.

Quando era menino minha mãe
via dias num aquário de neve
prédios de pernas ao contrário
dentro de paredes líquidas.
Respirava água a alta torre, a casa mais bonita
e as mãos pequenas de criança à roda fixa
do mesmo cristal, sem renas, feitas de pedaços
de penas, estrelas brancas, ora em cima
ora em baixo.

A minha cidade tem paredes cor de tela
escrevo nelas palavras anónimas de grafites
de pastel, na forma perene de gravuras
ilustradas, serpentinas de pincel.

Por vezes no Carnaval
quando era menino minha mãe
fazia chapéus de listas, de fitas coloridas
mas um dia disse uma asneira picante
pediu-me a língua e pôs
pós de cor gengibre, especiaria opalina
pimenta, ardia ardia ardia
guardei as lágrimas numa bolsa pequenina.

As paredes dos meus sonhos são feitos de névoa fina
são rios ou areias movediças
mas não os sei
nem qual é o seu destino
guardo risos guardo lágrimas
numa bolsa pequenina
a bolsa de minha mãe
aquela que viu nascer
os meus sonhos de menino
as paredes do meu ser.