sábado, 29 de agosto de 2009

Coisas, pequenas coisas





Fazer das coisas fracas um poema.

Uma árvore está quieta,
murcha, desprezada.
Mas se o poeta a levanta pelos cabelos
e lhe sopra os dedos,
ela volta a empertigar-se, renovada.
E tu, que não sabias o segredo,
perdes a vaidade.
Fora de ti há o mundo
e nele há tudo
que em ti não cabe.

Homem, até o barro tem poesia!
Olha as coisas com humildade.

Fernando Namora, in "Mar de Sargaços"

Are you going?



O vento buliçoso de bom dia
maré viva de bandeira rubra
sinal de perigo
condição objectiva de largar areias
as águas frias
e subir acima à pequena catarata
roda larga de madeira
velha azenha.

Subsistia límpida a transparência
um cardume roçando a pele
de tamanho pequeno.

O ruído constante de pedras lavadas
as águas correntes de um rio.

Bandos de natureza amiga como brisas
no vento de borboletas
nos bichos barcos de quatro patas
às dezenas subindo junto às margens.

O sabor doce de figos brancos
após o banho o encontro dos trevos
entre pinheiros e odores frescos
de eucaliptos abrindo narinas
os sentidos nas sombras verdes
o deitar pleno nas toalhas dos arbustos
nos braços dos acordes mi menor e sol maior
de uma pergunta de estrofes antigas:

"Are you going to Scarborough fair
Parsley, sage, rosemary and thyme...".

A melodia sussurrou o silêncio das seivas
a leveza do ar por mais de uma hora;
a guitarra de olhos fechados pousada
e as árvores como cordas
tangiam os corpos como pautas
entre os dedos e os lábios roxos -