sexta-feira, 25 de março de 2011

Um poema de Sophia - Ítaca


Saul Leiter



Quando as luzes da noite se reflectirem imóveis nas águas
[verdes de Brindisi
Deixarás o cais confuso onde se agitam palavras passos
[remos e guindastes
A alegria estará em ti acesa como um fruto
Irás à proa entre os negrumes da noite
Sem nenhum vento sem nenhuma brisa só um sussurrar de
[búzio no silêncio
Mas pelo súbito balanço pressentirás os cabos
Quando o barco rolar na escuridão fechada
Estarás perdida no interior da noite no respirar do mar
Porque esta é a vigília de um segundo nascimento

O sol rente ao mar te acordará no intenso azul
Subirás devagar como os ressuscitados
Terás recuperado o teu selo a tua sabedoria inicial
Emergirás confirmada e reunida
Espantada e jovem como as estátuas arcaicas
Com os gestos enrolados ainda nas dobras do teu manto




Sophia do Mello Breyner Andresen "Geografia"