quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

PENSAMENTO

Um poema é uma espécie de critério de desempate entre o eu físico e a sua condição mais metafísica.

Sylvia Beirute

poema em letra pequena sobre a irreprodutibilidade


Lilla Cabot Perry



imprevisível,
como os astros que existem por detrás de galáxias.
de encantos distantes, inconcebidos e misteriosos.
um quadro de Dali surgiu como âncora.
falaram ininterruptamente enquanto segurava um vaso de prata
de olhar fixo nos outros rostos que passavam , não tão leves
não tão feitos de intangíveis transparentes, outras densidades.
laços invisíveis ataram os pés e suspenderam os corpos
no alto, sem gravidades.
não se tocaram e continuaram a trocar diversidades.
agora era Klimt que seduzia no ouro esfumado de figuras sofisticadas.
surgia, mais à frente, Picasso
e depois Magritte com chapéus et une pipe, intrigante, inconfessável.
fumaram um cigarro, soluçaram um pouco de fumo e fizeram um arco que rodou e rodava
até perder alguma nitidez, e desaparecer numa dança sem voz, no ar, diminuído
até ao diminuto de um átomo.
disse que gostava de Pessoa, de ser pessoa, de ser algo mais que o intermédio.
lançou dúvidas sobre os oráculos que dizem ultrapassar todas as barreiras
sem nunca falar de morte nem de dores que caminham lado a lado,
a mesma verdade que acompanha os oásis e a ardência das chamas, quando significam
mais do que fogo e mais do que um estado sólido e físico do corpo.
concordaram na alegoria, na semelhança, na simetria reflexa,
e na consequência de estarem por demais absortos nas evidências bruxuleantes.
os laços que se encontravam ainda mais ligados, apertaram . os arcos de fumo
ganharam permanência e rotina, aproximaram -
surgiram depois os óleos mais clássicos, alguns olhares de deuses, de ágoras, as praças gregas
seduzindo de razões e notoriedade, um simbolismo do atingível que perseguia as horas
e colocava túnicas de vidro, brisas de passado em lugares mágicos.
falaram do mar
da imponderabilidade das espumas, do sal.
e as lógicas secaram as nuvens e recriaram azuis de Rubens,
fluidos, imemoriáveis, inumanos, na irreprodutibilidade, filhos da aura,
como flores totalmente únicas, ricas em pólen
e aromas
e láudano -

josé ferreira 1 de dezembro 2011