quinta-feira, 8 de março de 2012

As Novas Cartas Portuguesas



Livro polémico e simbólico, publicado pela primeira vez em 1973, sobre a libertação feminina pelo qual Maria Teresa Horta haveria de ser agredida e insultada em plena via pública da cidade de Lisboa. ler mais sobre o livro e as autoras "As três Marias" aqui

As três marias - um poema para o dia da mulher



Chiara Rizzolo
Titolo: Virginia
Tecnica: digital art & photography
Dimensione: 50x50 cm

"Era uma Primavera irregular. O tempo em constante mudança punha nuvens azuis e purpúreas a voar sobre a Terra. No interior, agricultores olhavam, apreensivos, para os campos. Em Londres os guarda-chuvas eram abertos e depois fechados por pessoas que olhavam para o céu. Mas em Abril era de esperar um tempo assim."

Virginia Woolf "Os Anos"



1ªMARIA

Jovem Maria

Deslizo ainda junto de ti
encolhida nessa asa
onde a pele morena
de mão maior
me espaça os dedos
em ondas soltas
distendidas
na entrega louca-

Este Sol exterior no brilho ofusca
mas na redoma ainda sinto
o morno sopro de beijos
os sussurros e arrepios
num afagar de pomba
de bico escondido
onde me aninho -

Nesta rua não sou eu...
desprovida de sombras;
sete vezes mais leve
em cada passo levito...

Mas não te vendo
em cada minuto que passa
no desejo, na saudade,
sou a personagem aflita
no filme tremido,
na nitidez certa
de te querer
uma outra vez
à minha espera-

Maria Levita



2ª MARIA

Faz-se tarde Maria


Não gosto do olhar cinzento
quando me abraças ao fim do dia.
Procuro o sorriso distante
de fugidas de jardins
entre frases aos molhos,
gotas de orvalho frescas,
melodias de silêncios
entre copas e arbustos,
às escondidas curiosas
dos chapéus vigilantes -

Soltavas beijos em qualquer hora,
perseguias os aromas,
destruías rotinas no desafio
dos sentidos...
e agora onde páras, onde estás
meu amor das Primaveras-

Quero de novo os papéis queimados
de ornadas fantasias de poemas...
ser a musa, a deusa, a louca...
Onde estás?

Tenho a pressa e o desejo
de amores-perfeitos,
margaridas, dos jacintos
colhidos nos passeios
de Domingos,
entre raios de brilho,
relâmpagos de mar -

Porque não me vens de novo,
vestido de orquídeas, de sapatinhos verdes,
de rosas brancas, vermelhas, laranjas...
(antes que venha a noite),
visitar?

Não te quero assim -

Onde estás?... Onde estás?


Maria da Esperança



3ª MARIA

Memórias de Maria


Fecho o cesto de verga,
o vime da memória da tua ausência.
Não era p'ra ser assim
"Primeiro eu, só depois tu"
Mas dizias, afagando rugas:
"...espero por ti sentado
na manta de lã, quadrados azuis,
xadrez,
num relvado, junto a uma cesta
de flores... lá...
espero por ti
a meu lado..."

Saíste de mim neste mundo
Mas sei onde estás...
no outro lado do berço,
num baloiço, num embalo,
adormecido...
no Paraíso -

Guardo alegrias, consolos,
a companhia nos colos que
partilhámos...
Aqui...ainda és meu...
Ainda estás -

Não choro mais!

Maria do Céu



josé ferreira Outubro de 2008