segunda-feira, 2 de abril de 2012

LUZ

É estranha a dor da perda
Abismo entranhado na pele que esvazia o olhar
Rosto cinzento de nuvens
Desconexo o sonho vão ruma ao infinito
Onda paralela de saudade que abraça e destroça
A dor joga aos dados, lentamente com o corpo
Num duelo agudo, uterino de rasgo.
Sabor ocre ensimesmado que desenlaça lágrimas
É urgente voar.
Desdizem-se as verdades e os mitos num búzio que canta mar.
A dor é amoral e tem pó nas arestas.
O amor doce de primavera e a graça simples da saudade.
Um tempo que estagna e desaparece.
Como a alma quando morre.
Um embalo frio de tão real
O lado inacabado do nascer
A nua sombra em riste que enfim jaz
Com um novo raio de luz.

sobre as folhas iluminadas uma brisa indelével




no campo imaginário, nos antípodas, fora da cidade
não se viam casas, apenas árvores de copas alinhadas
e os olhos abriam sobre um vale e sobre castanheiros
sobre vários troncos de formas apropriadas, sem singularidades.
do lado esquerdo, dois de varas finas nas mãos do tempo, recentes.
quando seriam grandes? quando seria o momento?
aquele, em que se encontrassem altos
sobre a lisura e em sossego –

não havia casas apenas árvores de copas alinhadas
e havia um plano mesmo que imaginário –

sobre as folhas iluminadas uma brisa indelével
uma promessa de um deus desconhecido
de que um dia, naquele campo
correria a brisa, a brisa indelével
a única possível, definida, no deslizar dos sentidos –

o verde invadia em abundância o campo imaginário
e surgia nítido, junto dos castanheiros, um terreno cultivado de laranjas,
só de flores, sem a cor e ainda sem o globo de sumos -

um aroma intenso e profundo invadia tudo
um pólen precioso, de abelhas sem agulhas de fúrias
daquelas que voam muito, espalhando um ruído de sorrisos
de mãos nas mãos, cruzando e descruzando linhas
caminhos, quiromancias –

no campo imaginário o céu estava claro
usava uma camisa azul com linhas corridas nos pulsos;
algumas nuvens –


não havia escuridão nem medo.
os olhos partiam sobre as flores e havia borboletas
brancas, algumas de desenhos, brancas
asas rodeando as árvores, sem laranjas -

quando se juntam as mãos no campo imaginário
de cada um dos lados há duas que ficam vazias
essa a razão de procurar a substância, essências
flores que habitem –

no campo imaginário não há mãos vazias
colhem flores
sobem múltiplas vezes acima dos lábios, junto às narinas;
aspiram odores, aromas, uma tranquilidade fina, nas narinas –

é como se encerrassem o tempo dentro da cabeça
(uma sala de cinema às escuras, antes de um filme)
uma inconsciência de consequências, de cenas e fotografias;
pedaços autênticos, uma vida –

não sabemos onde mora o inconsciente
não há exemplos, não há espelhos
não sabemos se é gente autónoma
pregando tábuas, abrindo e fechando janelas
arejando a alma como se estendesse roupa
na extensão comprida de arames;
e a roupa oscilando e enroscando-se
na direcção dos ventos –

não sabemos quem comanda o sonho
somos ignorantes, como as abelhas
o pólen e as borboletas –

seguimos uma ordem química, um signo, a desorientação de um excesso
ou a certeza mais certa de um caminho;
a solução das mãos, como uma mistura de sais
uma poção de magia alterando a cor do céu;
a cor intensa, vermelho vivo –

as pálpebras pesam
e os olhos estão para o homem como asas, visíveis e invisíveis,
na luz do sol ou protegidas;

abrem e fecham, sobre o sonho e sobre a vida –