quinta-feira, 31 de maio de 2012

Portugal_idade


Engarrafado na oliveira,
à mais de 100 anos,
o Gallo canta
Azeite!
Resolve à batatada
qualquer jantar

Ai que saudades da caldeirada!

e depois é manhã



                              Lillian Bassman "Carmen having tea" 1950



e depois é manhã, uma manhã resplandecente
depois da madrugada com as palavras debaixo do corpo
ainda morno e é primavera –

os teus olhos abrem-se na dificuldade dos braços espalhados
a perna esquerda levantada, a direita esticada, a tocar as dobras
uma profundidade –

e os meus da mesma forma –

e  é manhã, a manhã depois do sonho das fadas
das estrelas brilhantes, da lua branca, das tuas palavras
sem durezas, macias como uma espuma a tocar areias
e o mar afaga, e é longo –

guardo-te todos os diamantes, os que são líquidos, os sossegos mais claros
aqueles que compõem a alma, que lhe secam as lágrimas
aqueles que têm mãos e abraçam as omoplatas
as suas partes mais ósseas, para que sejam mais brandas
menos pesadas –

e depois é manhã, uma manhã de dedos e margens
que acenam e constroem pontes –

as nuvens são uma promessa
de trazerem alguma sombra e de darem um pouco de azul sem que outros vejam
um azul que estilhaça as cavernas, os fantasmas mais perversos
os limites do tempo na época dos frutos –

 e depois é manhã, a manhã resplandecente, sempre
até que um sinal de fumo anuncie a noite
o seu veludo, a rotação dos astros influentes
e resistentes
e eternamente iluminados –

e depois é manhã dentro do meu peito
no compasso imperfeito do sono, o círculo sem medo
que acorda o mármore dos templos e a deusa no seu manto

e as estrelas
e as estrelas –


 josé ferreira 31 maio 2012