sábado, 20 de outubro de 2012

Um poema para Manuel António Pina de José Almeida Silva






Homenagem a Manuel António Pina


É lá possível! O Poeta não morre!

É lá possível não ouvir a tua voz
No silêncio que te fizeste.
É lá possível não ficar triste
Ouvindo a notícia da tua morte

E ver-te ao mesmo tempo a dar
Corpo iluminado à tua sabedoria,
Que o tempo e os livros da tua vida
Teceram, e que me tocará para sempre.

Fiquei triste e com o coração sereno
Porque o teu olhar foi sempre a paz
E a serenidade de tratar bem a tudo
E a todos como os mestres da palavra
E da humanidade. Tu não partiste.

Ficaste entre nós nos teus versos
E numa poalha de ouro aspergida
Sobre as nossas vidas – a tua voz
Falando das coisas naturalmente.

A morte nada pode contra a Poesia –
                                               2012.10.19
                               José Almeida da Silva

A poesia vai acabar - um poema de Manuel António Pina




A poesia vai acabar, os poetas
vão ser colocados em lugares mais úteis.
Por exemplo, observadores de pássaros
(enquanto os pássaros não acabarem).
Esta certeza tive-a hoje ao
entrar numa repartição pública.
Um senhor míope atendia devagar
ao balcão; eu perguntei:
"Que fez algum poeta por este senhor?"
E a pergunta afligiu-me tanto
por dentro e por fora da cabeça que
tive que voltar a ler
toda a poesia desde o princípio do mundo.
Uma pergunta numa cabeça.
– Como uma coroa de espinhos:
estão todos a ver onde o autor quer chegar? –


Manuel António Pina