quarta-feira, 3 de julho de 2013

Um conto de Kafka - Os que passam a correr




Se vamos a passear à noite por uma rua e um homem que ao longe se avista - porque a rua sobe à nossa frente e a lua está cheia - vem a correr de encontro a nós, então não o vamos agarrar, apesar de ele ser fraco e andrajoso, apesar de vir uma pessoa a correr atrás dele e a gritar, vamos antes deixá-lo passar.
Porque é de noite e não temos culpa que a rua seja a subir e esteja iluminada pela lua, e, além de mais, talvez estes dois homens tenham organizado a caça para seu divertimento, talvez os dois persigam um terceiro, talvez o primeiro esteja a ser injustamente perseguido, talvez o segundo queira matar e nós seríamos cúmplices do crime, talvez os dois não saibam nada um do outro e cada qual apenas corra, por sua própria iniciativa, para a sua cama, talvez sejam sunâmbulos, talvez o primeiro esteja armado.
E afinal de contas não podemos nós estar cansados, não é verdade que bebemos muito vinho? Estamos contentes por também já não vermos o segundo homem.


Franz Kafka lido aqui